Em 16 de dezembro de 1968, três dias após a decretação do AI-5, a
solenidade de colação de grau dos concludentes da Universidade Federal
do Ceará, que seria realizada na concha acústica da Reitoria, foi
cancelada.
Trinta anos depois, em 16 de dezembro de 1998, a solenidade foi
finalmente realizada, na mesma concha acústica, com todas as
formalidades e emoções que a ocasião merecia.
O orador oficial escolhido à época pelos formandos, o coreauense Galba
Gomes leu, na solenidade simbólica, o mesmo discurso que havia elaborado
há 30 anos.
Tive o privilégio de ler o "discurso proibido", uma obra-prima que
retrata fielmente os sentimentos de uma geração brilhante, além da
profusão intelectual, coragem e consciência político-social do jovem
odontólogo de origem palmense.
Trata-se de uma ode às causas que comovem: a liberdade, a justiça
social, a educação para todos, o desenvolvimento econômico com respeito à
dignidade da pessoa humana... Uma ode demasiadamente atual, já passados
quase 45 anos, posto que quase todas as questões que afligiam o jovem
Galba Gomes ainda insistem em perturbar nossos dias.
Galba Gomes pintou, com o pulsar de suas veias, um memorável quadro da nossa história. E, ao contrário de muitos "yuppies sabor baunilha", permanece na luta pela construção de um mundo mais justo.
Eis o fecho do "discurso proibido", uma página sublime do "rebelde sem pausa", o maior nome das letras palmenses:
"(...) ocupemos o nosso território; mecanizemos a lavoura; asseguremos a
vida atual e a futura das nossas populações rurais; humanizemos a
existência dos nossos operários; e eduquemos a nossa juventude para a
construção do Brasil como potência mundial. Criemos as nossas indústrias
de base. Incrementemos a nossa produção de petróleo. Desenvolvamos as
nossas forças produtivas em todos os sentidos.
Aumentemos o número de nossas escolas primárias, médias e superiores.
Formemos bons professores. Implantemos no Brasil o ensino gratuito.
Enfim, pelo nosso desenvolvimento, asseguremos um mercado de trabalho
para os que se preparem para a vida nas faculdades e universidades do
País.
Juremos, meus colegas, batalhar pela grandeza material do Brasil. Mas
juremos também lutar contra a injustiça social, contra a revogação
tácita dos direitos do homem pelos códigos e constituições ditatoriais.
Fechemos nossas portas aos estrangeiros que ainda hoje cobiçam nossas
riquezas, mas abramos nossos braços àqueles que, emigrando de suas
pátrias, queiram trabalhar conosco, ombro a ombro, respeitando e amando
nossa bandeira.
E que nosso juramento não passe de mera formalidade. A nossa geração
responde pelo futuro do Brasil. Identifiquemos a nossa vida com o futuro
do Brasil: nos sofrimentos, nos sonhos, nas esperanças. Dentro de
alguns minutos, o destino colocará entre nós a distância física exigida
pela diversidade de nossas profissões. Mas estejamos certos de que se
faz necessário um ponto de encontro, na encruzilhada de nossos caminhos.
Esse ponto de encontro, vós bem o adivinhais: é o futuro de nosso
País." (Galba Gomes)